Fórum Justiça

Da imprescindibilidade da autonomia com participação social da Defensoria Pública

03/07/2013

Compartilhe!


Publicado em 30 de junho de 2013 por Paulo Lemos

Da autonomia da Defensoria Pública

O constituinte, no intuito de libertar o Brasil das amarras da ditadura e avançar no plano democrático, fez constar no texto constitucional uma miríade de direitos individuais, sociais, políticos e econômicos, e impediu que eles fossem suprimidos, elevando-os à condição de cláusulas pétreas, ou seja, tornou-os imutáveis; a não ser por uma nova constituinte.

Contudo, em que pese haver a previsão de direitos como educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, entre tantos outros, sabe-se que nem sempre eles são protegidos e providos pelo Estado.

É nesse vácuo entre previsão e efetivação de direitos que o direito fundamental ao acesso à justiça se insere, pois, nas palavras de Mauro Cappelletti e Bryant Garth, na ausência de mecanismos para sua efetiva reivindicação, a titularidade de direitos é destituída de sentido.

Essa responsabilidade recai sobre o sistema de justiça, composto pelo Poder Judiciário e pelas funções essenciais à justiça.

Como se sabe, o Poder Judiciário é inerte e sua provocação incumbe, afora outros, à Defensoria Pública, sobretudo para àqueles que não possuem condições de constituir advogado particular sem comprometer seu próprio sustento e de sua família.

Bom, para se ter uma ideia do que isso significa, importa destacar que a tabela de honorários da OAB/MT, por exemplo, estabelece o valor mínimo de R$ 2.016,84 para o patrocínio de uma Ação de Despejo. Para um Habeas Corpus em matéria cível – prisão do devedor de alimentos-, o valor indicado é R$ 4.033,68. Em matéria criminal, o pedido avulso de Liberdade Provisória sem Fiança sai por, no mínimo, R$ 2.521,05.

Não se contesta aqui os valores indicados, mas, considerando que no Brasil mais de 130 milhões de pessoas vivem com menos de R$ 1.866,00 por mês, a pergunta que deve ser feita é: quem garante o acesso à justiça dessa grande massa de pessoas necessitadas e vulneráveis? Por conclusão lógica, a resposta só pode ser uma: a Defensoria Pública!

Consciente disso, a Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos editou a Resolução AG/RES.2656 (XLI-0/11), além de duas outras sucedâneas, que, partindo da premissa que o acesso à justiça, como direito humano fundamental, é, ao mesmo tempo, o meio que possibilita que se restabeleça o exercício dos direitos que tenham sido ignorados ou violados, recomenda aos Estados membros que “adotem medidas que garantam que os defensores públicos oficiais gozem de independência e autonomia funcional.”

E o fortalecimento da Defensoria Pública se passa pela garantia de sua independência, por meio do reconhecimento concreto de sua autonomia funcional, administrativa e financeira, como bem fez o constituinte derivado quando aprovou a Emenda Constitucional nº 45/04, bem como os congressistas nacionais, ante a aprovação, no dia 21 de novembro de 2012, do Projeto de Lei Provisória nº 114/11.

Entretanto, apesar da manifestação do Congresso Nacional e das Notas Técnicas do Ministério da Justiça, todos favoráveis à sanção presidencial, cedendo à pressão de alguns governadores e secretários de fazenda e de planejamento estaduais, a Presidenta Dilma, como se sabe, vetou o projeto, mesmo tendo sido ele de iniciativa de um senador da mesma agremiação dela e apoiado por toda bancada governista.

Agora, nesse novo momento de levante da cidadania, bravamento das justas e legítimas reivindicações populares e ressemantização do real sentido e de re-memorização do que de fato significa violência e corrupção, concluindo que pouca ou nenhuma outra coisa representa melhor esse binômio do que a omissão do Estado ou a ação deliberada dele em negar e violar direitos fundamentais e humanos da sociedade, é estratégico que o Congresso Nacional mantenha coerência com sua posição pretérita e sintonia com as vozes roucas das ruas e derrube o veto presidencial, inclusive com autorização do Palácio do Planalto, o quanto antes.

Corrupção de prioridades e violência em face da cidadania e dignidade da pessoa humana é manter o quadro em que mais da metade da população brasileira não possui acesso aos serviços da Defensoria Pública e, consequentemente, à justiça, defesa e se ter direitos concretizados.

Essa página de apartheid jurídico-social precisa ser virada de uma vez por todas. Esse pernicioso débito de dignidade cidadã precisa ser quitado. O povo não pode e não quer mais esperar.

Afinal, já se foram longos vinte e cinco anos da promulgação da Constituição, podendo-se afirmar que já alcançou sua maioridade em vigor.

Não está a se dizer que com os recursos já disponíveis, através de uma gestão proba, transparente, eficiente e participativa, não dê para fazer mais do que foi feito até aqui. Não só dá, como deve ser feito.

Inclusive, mesmo com as condições atuais, não se pode abrir mão da observância dos direitos dos usuários e da qualidade dos serviços prestados e pela oitiva e contemplação de suas manifestações e vontade soberana.

Porém, nem a Constituição Federal e nem a Lei Orgânica da Defensoria Pública acrescentaram em sua missão institucional a função de se fazer milagres, muito menos de onipresença e de onipotência sobrenatural.

Para se ter condições de universalizar o sistema público de assistência jurídica plena e gratuita, com qualidade, garantindo equiparação de armas para o exercício de sua missão, e não para reprodução da cultura jurídica e postura das demais instituições do sistema de justiça, uma das providências imprescindíveis é a derrubada do veto ao PLP 114/11 e a aprovação da PEC 207/12.

Da participação social na Defensoria Pública

A sociedade civil organizada e o enorme contingente de usuários da Instituição esperam ter seus direitos de acesso, informação e participação não interditados, ante a criação e fortalecimento dos mecanismos de participação popular e a irrestrita observância dos direitos dos usuários.

E uma das atitudes urgentes aguardada pela cidadania é a adequação de todas as Defensorias Públicas à LC 132/09, sobretudo no que se refere à implementação da Ouvidoria-Geral, eleita e ocupada por alguém oriundo da sociedade civil, que nunca teve qualquer vínculo funcional com a Defensoria Pública enquanto membro, conforme constou expressamente proclamado na Carta de Belém e é querido pelas organizações sociais, inclusive pelo Fórum Justiça, para cumprir as atribuições previstas no artigo 105-C da LC 80/94, principalmente a de promover o intercâmbio e fortalecimento dos laços entre a população e a Instituição.

Apenas para não se perder de vista, não só a opção e posição constitucional da Defensoria Pública, como sua instalação e fortalecimento por quase todo Brasil, sempre contou com apoio de diversas organizações populares e defensoras dos direitos humanos e fundamentais da gente brasileira e do mundo inteiro.

Tudo, para promover mais e melhor justiça para todos, com mais defensores públicos, dispondo de condições dignas de trabalho e justa remuneração, com uma tópica emancipatória do Direito e de diálogo com todas as demais áreas do conhecimento e experiência humana, bem como, sobretudo, com participação direta da cidadania, abrindo uma fenda na justiça e um paradigma para ela, sempre inspirado pelo interesse público primário da sociedade, que é a única razão de ser e de existir de qualquer instituição democrática e republicana.

Paulo Lemos – Ouvidor-Geral da Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso

Download WordPress Themes
Download Nulled WordPress Themes
Download WordPress Themes
Download Premium WordPress Themes Free
ZG93bmxvYWQgbHluZGEgY291cnNlIGZyZWU=
download samsung firmware
Download Premium WordPress Themes Free
download udemy paid course for free