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NOTA DE REPÚDIO À POLÍTICA DE “DOR E SOFRIMENTO” NA CRACOLÂNDIA

11/01/2012

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Por Karina Chimenti

O Centro Acadêmico XI de Agosto, entidade representativa dos estudantes da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP), divulgou em sua pagina do facebook, uma nota de repúdio às ações realizadas na cracolândia na última semana.

Confira texto na íntegra:

NOTA DE REPÚDIO À POLÍTICA DE “DOR E SOFRIMENTO” NA CRACOLÂNDIA
O Centro Acadêmico XI de Agosto, entidade representativa dos estudantes da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP), vem a público manifestar repúdio ao Plano de Ação Integrada Centro Legal, iniciado em 03 de janeiro de 2012 na Cracolândia, região central de São Paulo.

O plano é errado tanto na sua concepção, quanto no modo como é executado. Esse projeto envolve a ação da Polícia Militar na região, buscando inibir o tráfico de drogas e dispersar os seus usuários, que também seriam impedidos de se fixar em outros locais. A denominada “política de dor e sofrimento” visa provocar abstinência nos usuários de crack, a partir da qual, em visão equivocada, eles buscariam tratamento junto ao Poder Público.

Deve-se atentar, primeiramente, à fragilidade desse plano, pois parte do pressuposto que o sentimento de fissura do usuário em abstinência ocasionará seu interesse em buscar tratamento, ignorando os demais efeitos, como outros problemas de saúde ou reações violentas à abstinência. Ainda que essa política agressiva e desumana em andamento efetivamente gerasse busca por tratamento, a cidade de São Paulo não teria condições para atender os usuários, pois carece de estrutura adequada para tanto. E pouco se faz a esse respeito.

Diversos agentes do Poder Público também têm reiterado que a migração dos usuários a outras regiões será combatida, concluindo-se, então, que a operação será estendida para outros pontos da cidade. Transparece, dessa forma, a adoção de uma estratégia que somente expulsa os usuários de um lugar a outro, continuamente, em detrimento da oferta de alternativas reais de reabilitação que respeitassem verdadeiramente a dignidade dessas pessoas e visassem, de fato, recuperar sua saúde.

A execução do plano é reflexo dos problemas em sua concepção. As autoridades afirmam que o crack é uma questão de saúde pública. A prática, entretanto, prova o contrário. A ação policial ostensiva, planejada e detalhada, reprime o usuário e contrasta com a nebulosidade do plano de ação referente à recuperação da saúde dessas pessoas. O alvo da polícia, que seria o tráfico, acaba sendo o usuário. A eficácia no combate ao tráfico é mínima e o desrespeito aos usuários, enquanto seres humanos, enorme.

O Plano de Ação Integrada Centro Legal limita-se, portanto, à ação policial direcionada aos usuários e tem ensejado constantes violações aos seus direitos. É inadmissível, em um Estado Democrático de Direito, que agentes do Poder Público cometam repetida e sistematicamente atos de agressão física e moral contra os cidadãos, em claro abuso de autoridade e desrespeito aos direitos humanos. O combate ao tráfico de drogas não pode servir de pretexto para ignorar a necessidade de implementação de políticas públicas de saúde e assistência social para uma população marginalizada e doente.

A simples e violenta retirada dos usuários de crack do espaço público não resolve o problema de uma população já desamparada, que não tem outro lugar aonde ir e que sofrerá forte repressão policial para somente então, e em visão equivocada, perambular em busca de uma ajuda incerta.
Sendo assim, as entidades e pessoas abaixo assinadas declaram que:
Não admitem que os usuários de crack, parcela vulnerável e marginalizada da nossa sociedade, tenham como tratamento estatal a ação policial repressiva no lugar da implementação de políticas de saúde pública e de assistência social;
Não admitem que essa população seja expulsa dos espaços públicos que ocupa, sendo forçada a uma migração permanente, em que não há real perspectiva de melhora de vida;
Não admitem que uma operação estatal seja realizada em desrespeito aos direitos humanos, e que agentes estatais cometam sistematicamente atos de agressão física, moral e patrimonial contra a população, de modo indevido e impunemente.
Centro Acadêmico XI de Agosto – Faculdade de Direito da USP
Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos
Centro Franciscano – SEFRAS
Clínica de Direitos Humanos Luiz Gama – Faculdade de Direito da USP
Instituto Luiz Gama
Instituto Pólis
Instituto Práxis de Direitos Humanos
Instituto Terra Trabalho e Cidadania – ITTC
Movimento Ministério Público Democrático
Núcleo de Antropologia Urbana da USP
Pastoral Carcerária
SAJU – Faculdade de Direito da USP
UNEafro-Brasil
Alamiro Velludo Salvador Netto – Professor Doutor do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da USP
Alvino Augusto de Sá – Professor Doutor do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e criminologia da Faculdade de Direito da USP
Alysson Leandro Barbate Mascaro – Professor do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direito da USP
Amando Boito Jr. – Professor da Unicamp
Antônio Carlos Amador Pereira – Psicólogo e Professor da PUC-SP
Ana Maria de Niemeyer – Professora do Departamento do Antropologia da UNICAMP
Antônio Magalhães Gomes Filho – Professor Titular de Processo Penal e Diretor da Faculdade de Direito da USP
Boris Fausto – historiador e professor aposentado do Departamento de Ciência Política da FFLCH – USP
Caio Navarro de Toledo – Professor do IFCH da Unicamp
Celso Fernandes Campilongo – Professor Titular do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direito da USP
Diogo Coutinho – Professor Associado do Departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da USP
Eros Roberto Grau – Professor Titular aposentado da Faculdade de Direito da USP e Ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal
Dimitri Dimoulis – Professor de Direito Constitucional da Direito GV
Geraldo José de Paiva – Professor Titular do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho do Instituto de Psicologia da USP
Gilberto Bercovici – Professor Titular do Departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da USP
Helena Regina Lobo da Costa – Professora do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da USP e coordenadora do IBCCRIM
José Fernando Simão – Professor Associado do Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP
Jorge Luiz Souto Maior – Professor Associado do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da USP
José Guilherme Cantor Magnani – Professor Livre-docente do Departamento de Antropologia da FFLCH-USP
Lídia de Reis Almeida Prado – Professora Doutora do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direito da USP
Marcio Naves – Professor de Sociologia do IFCH – Unicamp
Marcio Suzuki – Professor do Departamento de Filosofia da FFLCH USP
Marcus Orione – Professor Associado do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da USP
Mario Gomes Schapiro – Professor da Direito GV
Mariângela Gama de Magalhães Gomes- Professora Doutora do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da USP
Miguel Reale Júnior – Professor Titular do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da USP e ex-Ministro da Justiça
Nádia Farage – Diretora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp
Nilza Micheletto – Professora do curso de Psicologia da PUC SP
Otávio Pinto e Silva – Professor Associado do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da USP
Paulo Eduardo Alves da Silva – Professor do Departamento de Direito Privado e Processo Civil da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto – USP
Pedro Vieira Abramovay – Secretário Nacional da Justiça em 2010
Rafael Mafei – Professor da Direito GV
Ricardo Antunes – Professor de Sociologia do IFCH – Unicamp
Rodrigo Naves – Crítico de Arte e Professor
Samuel Rodrigues Barbosa – Professor Doutor do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direito da USP
Sérgio Salomão Shecaira – Professor Titular do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da USP
Sidney Chalhoub – professor titular de História da UNICAMP

Para saber mais sobre às ações realizada no Centro de São Paulo veja:

– Quase metade dos usuários de crack da cracolândia do centro de São Paulo se submeteria ao tratamento da dependência
– Ministério Público de São Paulo abre investigação sobre operação policial na cracolândia
– PM reforça policiamento no Bom Retiro, Santa Cecília e Higienópolis; 58 são presos na cracolândia
– PM dispersa viciados com bombas e balas de borracha

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