Democratizar nomeação para o STF é possível
Bolsas de apostas, lobbies e listas prontas.
A aposentadoria de Cezar Peluso deflagrou o processo de escolha dos novos ministros do STF.
Até o final do ano, três vagas devem se abrir para a nomeação da presidenta Dilma Rousseff. Além do desembargador paulista, aposentam-se o presidente Ayres Britto e provavelmente o decano Celso de Mello.
Diversos órgãos de imprensa têm divulgado relações de nomes supostamente cotados, mas ainda não é possível separar o joio do trigo; a probabilidade do mero desejo, pois não existem informações oficiais.
Até mesmo o ministro Joaquim Barbosa, navegando na popularidade midiática, sinalizou a pretensão de influir na escolha para indicar sua própria lista de nomes de “fora do mundinho de Brasília”, seja lá o que isso possa significar.
É lícito que magistrados, advogados e mesmo entidades da sociedade civil tomem parte deste processo, de preferência às claras.
Embora a prerrogativa de nomear ministros da Suprema Corte seja da Presidenta da República, com a aprovação pelo Senado, nada impede que a sociedade possa participar abertamente da escolha.
Poucas funções na construção do Estado democrático têm hoje tanta importância quanto à de ministro do Supremo.
A ampla judicialização dos conflitos e a assunção da natureza essencialmente política do controle de constitucionalidade têm legado ao tribunal a responsabilidade de algumas das decisões mais candentes da sociedade moderna: a legalidade da união homoafetiva, a liberdade de manifestação contra a lei, a constitucionalidade da pesquisa com células-tronco, entre outras.
Sensível à evolução social, elemento de integração da democracia e obrigatoriamente defensor perene da dignidade humana, um ministro do STF deve ter, sobretudo, independência que o permita reagir a pressões do poder econômico, dos partidos políticos e também da mídia.
Só assim poderá desempenhar sua função primordial –nunca é demais registrar- que é a de ser o garantidor dos direitos fundamentais.
Quanto mais transparente for a sua nomeação, mais conhecida sua vida e seus pensamentos, sua formação e atuação pretérita, mais segurança se terá quanto ao agir no futuro.
Foi nesse sentido que o ex-presidente da Argentina, Nestor Kirchner, estabeleceu mecanismo que ampliou a participação social na escolha dos ministros da corte suprema, sem abrir mão da competência constitucional de indicação, que também lá é do Presidente da República.
Por intermédio de um decreto, instalou processo de escolha, que se inicia com a publicação oficial dos nomes considerados para o cargo pela presidência, juntamente com seus currículos. Isso possibilita que a sociedade os conheça e participe, agregando informações e apoios.
Cabe aos candidatos, nesse sistema, fornecer publicamente a relação de seus bens e a indicação das sociedades civis, empresas e escritórios que integraram, para conhecimento público –abrindo-se prazo para que cidadãos, associações e entidades possam opinar.
Se adotado por aqui, a escolha continuaria sendo da Presidência da República para indicar e do Senado para aprovar, sem a necessidade de qualquer emenda constitucional.
A proposta de importar esse modelo argentino vem sendo sugerida oficialmente pela Associação Juízes para a Democracia. O momento atual, com a perspectiva de abertura quase simultânea de três vagas é altamente propício para amadurecer este debate.
A participação dos cidadãos e da sociedade civil organizada tornaria essa escolha mais transparente.
O compromisso que os futuros ministros devem ter com a defesa do estado de direito e a irrenunciável prevalência dos direitos humanos tem tudo a ver com um processo com mais democracia –um elemento ainda de pouca presença na formatação do Judiciário brasileiro.