Turma de Direito Evandro Lins e Siva – “Não existe o verbo ‘desestudar’”
http://racismoambiental.net.br/2012/08/vitoria-nao-existe-o-verbo-desestudar/
Patrick Mariano Gomes*, para Combate ao Racismo Ambiental
Na defesa dos alunos da primeira Turma de Direito do Brasil, formada por filhos e filhas de assentados da reforma agrária e da agricultura familiar, o advogado Cezar Britto, da tribuna do Tribunal Regional Federal da primeira região, em Brasília, proferiu a frase acima ao falar da realidade de educação no campo, bem como da dívida histórica para com a população rural brasileira.
A ação, proposta pelo Ministério Público de Goiás, visava extinguir o curso de direito e impedir que 60 filhos de trabalhadores e trabalhadoras tivessem acesso ao ensino superior e se tornassem futuros advogados, juízas, professoras, defensores. O cerne da ação era baseado no argumento de que, para esta camada da população, estudar direito não serviria para nada, desviaria a finalidade da reforma agrária. Melhor seria se estudassem agronomia, fossem técnicos agrícolas e não “doutores”.
O ensino jurídico no Brasil, desde os tempos da Colônia – quando os filhos da elite desembarcavam em Coimbra para estudar direito e depois continuar mandando aqui no Brasil, em índios, caboclos, negros, imigrantes pobres, sem terras – sempre esteve ligado às elites e seu projeto de poder e dominação.
A experiência da Turma Evandro Lins e Silva foi exitosa. Antes mesmo de se formarem, 8 estudantes já haviam passado na prova da Ordem dos Advogados do Brasil, sendo que, no dia 11 de agosto, todos foram aprovados com distinção pela Universidade Federal de Goiás – Campus Cidade de Goiás, recebendo seus diplomas em bonita formatura naquela cidade.
No dia 11 de agosto, quando receberam seus suados e merecidos diplomas, 12 alunos já haviam sido aprovados na OAB. Mas, apesar de tudo isso, de terem se formado com louvor, concluído todos os créditos e aprovados no exame da OAB, a ação do Ministério Público prosseguia, como fantasma conservador querendo estragar a festa, querendo que todos “desestudassem” ou desaprendessem o que durante 5 anos aprenderam.
Porém, na data de hoje, 24 de agosto, felizmente fez-se justiça. O próprio Ministério Público que trabalhou no processo no Tribunal, reconheceu o equívoco de seu colega de Goiás e seguiu o raciocínio da defesa de que não havia interesse de agir na propositura da ação.
Como bem disse o advogado Cezar Britto, a Justiça e o Direito não são exclusividades de um prédio na cidade, são muito mais amplas que isso. A Justiça e o Direito estão, também, na caatinga, no cerrado, nas plantações de milho, nas cooperativas agrícolas dos trabalhadores, na luta quilombola, na luta indígena e, em cada sorriso de uma criança sem fome. Hoje, mais que nunca, isso fez-se realidade!
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* Advogado da RENAP, atualmente exercendo o cargo de Coordenador na Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, e que esteve presente ao julgamento. Enviada através de Rodrigo de Medeiros Silva.